
A mídia e a espetacularização da cultura de Maria do Rosário Gregolin é interessante porque discute claramente como a mídia mescla os acontecimentos apresentados ao público através dos telejornais e programas.
Compreendendo o processo da transformação da cultura em espetáculo, torna ainda mais complexo e dificultoso distinguir nos noticiários o que é ficção e o que é realidade. Ou seja, os fatos presentes em uma reportagem jornalística se assemelham às histórias, aos capítulos de uma novela, de um filme e vice-versa.
Os meios de comunicação predominantemente jornalísticos adotam o modelo da ´´teatralização`` e fazem da realidade um espetáculo, um show, com direito a audiência e aplausos. Se analisarmos alguns acontecimentos polêmicos nos últimos anos, perceberemos tal similaridade existente entre o universo da fantasia e o universo concreto.
Exemplo claro e óbvio é o ´´inesquecível`` 11 de Setembro quando as torres gêmeas nos Estados Unidos deixaram de ser um dos símbolos do país e foram destruídas com o suposto atentado, transformando-se em pó. A cena mostrada constantemente nos telejornais era típica, familiar dos telespectadores, devido, as grandes produções cinematográficas norte-americana. Complementando o envolvimento da realidade com a ficção, Maria Gregolin destaca:
11 de Setembro: assistimos ao vivo, pela televisão, aviões se chocarem contra as Twin Towers e a cena era familiar, pois, já a tínhamos visto, inúmeras vezes, nas telas, em super-produções americanas. Entre a cena real e alguma cena de filme, ficamos indecisos: como distingui-las na era das tecnologias de informação, quando tudo se volatiza em imagens e redes flutuantes que invadem nossa percepção? O assombro banalizou-se. A cena, incontáveis vezes repetida, cristalizou-se nos instantâneo de nossas retinas, como parte do espetáculo que, passando o espanto, grudou-se no cotidiano. (Gregolin, 2003, p. 1)
Essa transformação – dos acontecimentos em espetáculo – não deve ser considerada meramente por preferências e motivos particulares de um ou outro, que atendem apenas um setor dominante. Mas por fatores específicos que ao mesmo tempo envolvem questões ideológicas, audiência, lucro e a própria política que aqui não será aprofundada.
Se o objetivo é mostrar o espetáculo que a mídia faz de determinados assuntos abordados pelos diversos veículos de comunicação, o recente caso Eloá serve como comprovação desta prática comum dos telejornais e outros diversos programas de informação.
A jovem de 15 anos, morta pelo namorado após um seqüestro de dias intermináveis tornou-se mais um espetáculo da imprensa brasileira. Além de outros acontecimentos que já tiveram seus 15 minutos de fama, como o caso Suzane Von Richthofen e o caso Nardoni, este, também serviu enquanto disputa de audiência, apresentando durante a semana uma seqüência de capítulos, deixando os telespectadores na expectativa.
Ao escolher o Jornal Hoje da rede Globo para esclarecer e fundamentar esse tipo de trabalho fica evidente determinada proporção e tamanha repercussão e atenção atribuída no caso pelos meios de comunicação.
O que mais surpreende é o ´´vai e volta`` e o ´´bate na mesma tecla`` que apresentadores e repórteres exercitam a cada edição. O dia seguinte nem sempre acrescenta novas informações e, quando acrescentadas, são minoria.
Válido mesmo é ´´relembrar`` a cada programa o que é o caso e, é claro, não deixar de mostrar imagens semelhantes aos dias anteriores, as quais, quando analisadas criticamente não acrescentam em nada. São imagens vagas.
Discursos e recursos semióticos são nada mais que meios utilizados pela maioria dos veículos para ganhar a atenção do público. Especificamente o Jornal Hoje, além de matérias prontas exibidas diariamente, imagens ao vivo também eram exploradas, onde, repórteres permaneciam de plantão no local do seqüestro. Discursos como ... Era pra ser apenas a história de um amor. Virou um crime... Enfeitavam a reportagem.
Dessa forma, o mesmo caso passa a ter maior destaque quando o seqüestrador Lindemberg inicia sua negociação com policiais. O seqüestro que já durava três, quatro dias era assunto de ônibus, fila de banco, bate papo de bar, aula de faculdade e de todos que pararam no tempo para assistir ao espetáculo. Esqueceram que outras notícias vagavam por aí e que poderiam ter muito mais relevância na vida de cada um do que o próprio caso Eloá.
17 de Outubro, 96 horas de cativeiro. O Jornal Hoje volta com informações ao público, imagens gravadas, imagens ao vivo. Todos os dias o show era apresentado. 18 de Outubro – dia seguinte – termina o seqüestro com um resultado nada positivo. A adolescente morre e a amiga é ferida.
Não bastasse todo o envolvimento da mídia durante o seqüestro da jovem, o ´´roteiro`` não terminava ali. As cenas continuavam a ser gravadas, surpresas ao público aconteciam.
A cada capítulo novas revelações. Para quem conhece as histórias das novelas brasileiras sabe o que estou falando. As revelações em torno do histórico de vida do pai de Eloá que, aliás, já estava morta era o que ainda prendia os telespectadores na continuidade do caso.
Uma continuidade que rendia audiência e conseqüentemente lucro, mas, que não saía da mesmice. E o Jornal Hoje – apesar das exceções – estava sempre presente no sistema ´´repeteco.``
Neste trabalho, o telejornal da rede globo foi o destaque para que houvesse uma melhor exemplificação do que foi discutido. Entretanto, sabemos que não só o Jornal Hoje, como outros diversos telejornais e programas trabalharam da mesma forma neste e demais casos em destaque na mídia. Telejornais que não se limitavam apenas a rede globo, mas também há outros canais.
Band, SBT, Record ... tem lá seus criadores de espetáculo. Assim como os programas de rádio e os noticiários em jornais impressos, afinal, são eles a mídia.
Ao propor um paralelo com outras matérias estudadas na faculdade e temas discutidos e analisados em sala, várias questões surgem como causa e duvidas sobre esse comportamento de espetacularização pela mídia. Seria, portanto, essa conseqüência do espetáculo - visando à audiência e o lucro – uma questão proporcionalmente do agendamento?
A mídia sabe perfeitamente causar essa transformação assustadora e dar seus próprios caminhos e finais aos acontecimentos. Com essa questão em destaque parece irônico, mas, relativamente interessante saber quem é que ensinou ao outro o poder de contar histórias ao público. Os autores de novelas ou os telejornais?
Glória Perez, Manoel Carlos, Aguinaldo Silva, de certa forma, assistem aos jornais para criarem seus personagens e suas histórias. Enfim, a ficção copia a realidade ou a realidade copia a ficção?
Eloá foi a protagonista que não se deu bem. O vilão está preso, mas vivo. A historinha da jovem seqüestrada já rendeu bons capítulos nos jornais. Outros contos vão surgindo, outros acontecimentos ganham destaque e também se transformam em espetáculo.